Translatio Scientia

Início » Uncategorized

Arquivo da categoria: Uncategorized

The pallet

Chep pallet

Palete de madeira e garfos de uma empilhadeira

 

O que é que é um pallet? Esse termo, em inglês, designa um estrado ou plataforma utilizada para a movimentação de cargas. Geralmente, as embalagens secundárias como caixas ou pacotes empilham-se nele de modo a aproveitar o espaço e compactar a carga a fim de facilitar a movimentação. Embaixo da plataforma, há algumas cavidades para introduzir os garfos da empilhadeira, o que permite seu transporte. Em Português, uma vez que este termo foi criado no final da Segunda Guerra Mundial, não existe uma palavra vernácula (ou seja, tradicional), apenas se adaptou a grafia como palete (segundo pode-se observar no Aurélio e outros dicionários). A palavra entrou para o idioma por intermédio do francês.  Já em Espanhol usa-se uma diversidade de termos como paleta, pallet no México, a palavra vernácula tarima também no México. Entretanto, a ortografia oficial dada pela Real Academia da Língua Espanhola é palé. Isso porque se seguiu a norma de castelhanização de outras palavras terminadas com “t”, como ballet-> balé; carnet -> carné; bidet -> bidé.

 

Escramblase: a enzima que mexe

Não há campo mais curioso (para mim, pelo menos) que os nomes dos compostos químicos e bioquímicos. É claro, nos livros fala-se que eles devem ser descritivos e fazer referência à função, mas historicamente os cientistas têm batizado suas descobertas com muita imaginação.

Por exemplo, o ácido barbitúrico. Seu descobridor, o alemão von Baeyer, denominou-o assim por tê-lo descoberto em 4 de dezembro, dia de Santa Bárbara. Os bukminsterfullerenes (buckyballs para os amigos), compostos de carbono, foram uma homenagem ao design e arquiteto Buckmister Fuller, pela semelhança com seus domes geodésicos (formas que ele usava em seus desenhos).

E a draculina (draculin em inglês) foi o nome “lógico” de uma glicoproteína achada na saliva dos morcegos vampiros…

Enquanto no passado os nomes derivavam-se do latim, hoje temos nomes provenientes do alemão, francês, espanhol e, sobretudo, do

scramblase

Escramblase, numa representação de fitas.

inglês. Os anglofalantes, diferentemente de nós latinos, são mais descontraídos na hora de dar um nome. Quando descobriram uma enzima que transloucava (translocate), ou seja, passava fosfolipídios entre as duas camadas da membrana lipídica, não desanimaram pelo fato do nome “translocase” já ter sido usado. Pegaram o termo inglês scramble (mexer) e formaram scramblase. Ainda bem que a tradição dita que os nomes dos compostos não são traduzidos pelo significado, só adaptados à grafia da língua. Assim, temos escramblase em português e escramblasa em espanhol (sim, nós mudamos a terminação –ase das enzimas para -asa).

Agora, há muito estudante com imaginação fértil demais. Na minha faculdade, esta enzima era conhecida como revoltillasa (revoltillo = scrambled eggs). Em Português: ovomexidase, ou uma mais próxima ao original: mexidase. Se você acha ridículo, pense no porquê dos anglofalantes poderem usar palavras comuns na ciência e nós morrermos de vergonha de usar as nossas. Então, se está para isolar ou descobrir um novo composto, por exemplo, do Rio Tietê, pense seriamente em batizá-lo como Tieteína. Os anglofalantes vão adorar.

Data is or Data are: um clássico da “anarquia linguística” do inglês

Pense um instante: se você quiser saber se uma palavra existe em Português, vai ao VOLP (Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa). E se tiver dúvidas sobre a ortografia, consulta o Novo Acordo Ortográfico e as recomendações da ABL (Academia Brasileira de Letras). Bom, em Espanhol é ainda mais fácil: temos o Dicionário, a Ortografia e a Gramática da Real Academia Espanhola, que já vêm em acordo com os pareceres das Academias Hispano-Americanas e são a palavra oficial do idioma. No Inglês, não existe nem Acordo Ortográfico, nem Academia da Língua, nem órgão facultado por lei, ainda que num só país, que se possa considerar oficial. É a “anarquia linguística”. Além de ter distintas grafias entre países, as dúvidas gerais da língua não têm uma única resposta, ficando tudo em questão de opiniões, recomendações de dicionários mais ou menos prestigiosos (como o Oxford) e Manuais de Estilo dos jornais e grupos editoriais.

Assim, se você quiser saber se data é um plural (e então diria data are) ou, pelo contrário, é singular (e usaria data is), você tem que escolher se segue ao Oxford, ao Boston ou àquele gramático de quem você gosta tanto.

Etimologicamente (ou seja, segundo a origem), data é um plural latino do singular datum (dado). Como pouquíssimas vezes faz-se referência a um dado isolado, falava-se sempre the collected data, the data show that, our data suggest, à semelhança de, por exemplo, mitocôndria (mitochondria are organelles, mas one mithocondrium). Com o passar do tempo, data foi assimilada como o nome singular de um conjunto (como pack, alcateia), ou como um substantivo incontável (por exemplo, information) que não têm plural, e que teria o valor de informação ou fatos. Os que defendem isso rejeitam também datum, e preferem a piece of data.

Já os que defendem data como plural assinalam que, quando falamos data shows that, na verdade fica implícita a ideia de data set, o conjunto dos dados. Ainda que sejam poucas as ocasiões de usá-lo, o correto para eles é this datum, one datum.

Na prática, contanto que você mantenha a coerência interna, tanto faz se você usa como singular ou plural.

Aliás, eu pessoalmente tendo a ser bastante conservador nas palavras técnicas, e sempre favoreço as dicas do Oxford Dictionary. Portanto, se as normas de estilo do jornal não especificam outra coisa, escrevo: These data, the data suggest, there is a missing datum in row three of the table.

“Ramonera”

Pata de jamón ibérico (spanish cured ham)

Presunto ibérico na “ramonera” 

Vende-se “ramonera“. Assim dizia o cartaz da loja que pretendia vender um suporte de presunto ibérico. Acredito que eles quisessem dizer jamonera, do espanhol jamón (presunto). O curioso é que jamonera (pronunciado mais ou menos “ramonera”) é mais comum em inglês como nome desse artefato, que em bom e velho castelhano denomina-se soporte jamonero, portajamones ou ainda jamonera, embora de modo menos frequente.

Um billón é um trillón e é um millardo

Até pouco tempo, os hispano-falantes consideravam como má tradução o uso de billón com o significado de mil milhões. Ainda que em inglês e português seja o correto, nós mantemos a “escala longa” onde um billón são um milhão de milhões (ou seja, um trilhão) e um trillón, um milhão de trilhões (um quintilhão). Para evitar o uso e confusão do bilhão inglês (e brasileiro), incluiu-se no Dicionário da língua espanhola uma palavra proposta pela Venezuela: millardo, com o significado de mil milhões.

Mas nossa Academia da Língua Espanhola tem nos complicado a vida. Recentemente aprovou a inclusão de termos denominados estadounidismos (é isso mesmo, do Espanhol dos Estados Unidos). Juntamente com outras palavras como email e aplicar, já de uso comum, consagrou-se um erro de tradução que havia sido tão combatido no passado. Agora, billón em espanhol pode significar mil milhões e trillón, milhão de milhões, como em Português.

Você achou complicado? Imagine nós, que agora temos três palavras com o mesmo significado. O billón novo é igual ao millardo antigo e o billón antigo é o trillón novo. Entendeu? Tudo bem. No “Manual de Estilo” falamos da nossa opinião e de como vamos a usar esta salada de termos.